Autos Pastoris
- Jorge Monteiro
- há 5 dias
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A tradição da representação da peça "Autos Pastoris", também conhecidos como "Autos de Natal dos Pastores", tem raízes profundas na cultura popular e religiosa de Portugal e do Brasil, com origens medievais e influência direta do teatro sacro cristão europeu.
Pelo que foi possível apurar, os Autos Pastoris derivam dos mistérios e autos religiosos da Idade Média, especialmente na Península Ibérica. Estão ligados à tradição cristã de celebrar o nascimento de Jesus, com foco no anúncio feito aos pastores no campo. Com o tempo, os Autos Pastoris tornaram-se formas populares de teatro religioso, especialmente em comunidades rurais. Os elementos religiosos, humorísticos e comunitários combinam-se em narrativas simples e populares, com forte caráter festivo, didático e identitário.
Os Autos Pastoris incorporam um repertório musical profundamente enraizado nas tradições folclóricas portuguesas, com cantigas de Natal e de Reis. Essas músicas são muitas vezes harmonizadas por compositores do século XX, entre os quais se destacam Fernando Lopes‑Graça e Fernando Lapa, que trouxeram uma dimensão culta à tradição oral.
Além disso, as performances populares costumam recorrer a uma combinação de recitação dramática, canto coral, voz solista e acompanhamento instrumental, dando às encenações um ambiente rico e envolvente que mescla o sagrado, o comunitário e o teatral.
Com raízes profundamente enraizadas na cultura local, a peça Autos Pastoris representa uma tradição de grande significado para Santana, sendo, há várias décadas, representada com regularidade na Sociedade Musical Santanense. Esta peça, de carácter religioso e profano, divide-se em quatro atos (1), ao longo dos quais se narram episódios relacionados com o nascimento de Jesus, entrelaçados com momentos de crítica social, humor e reflexões populares, numa fusão rica entre o sagrado e o quotidiano.
Um dos elementos centrais desta representação é o acompanhamento musical, que contribui não só para a atmosfera envolvente de cada cena, como também para reforçar a expressividade e o simbolismo do enredo. A participação dos músicos da Banda da Sociedade Musical Santanense tem sido, ao longo dos anos, indispensável para a manutenção da qualidade artística e da autenticidade desta tradição.
Importa destacar, com especial reconhecimento, o trabalho dedicado e persistente do grupo cénico amador, que, ano após ano, dá vida às personagens desta peça com entusiasmo e entrega. Trata-se, na maioria dos casos, de membros da comunidade local, com ocupações profissionais diversas, que dedicam horas ao ensaio após os seus dias de trabalho, muitas vezes sacrificando tempo pessoal e familiar em nome da preservação desta expressão cultural coletiva.
A par dos intérpretes, merece também referência o trabalho dos ensaiadores, responsáveis pela direção da peça, bem como de toda a equipa de apoio técnico e logístico, que assegura o bom funcionamento da representação, desde os cenários e guarda-roupa até à coordenação geral do espetáculo. É este esforço conjunto que permite que os Autos Pastoris continuem a ser apresentados com dignidade, qualidade e significado, mantendo viva a ligação da comunidade às suas tradições e ao seu património cultural imaterial.
A continuidade desta representação na Sociedade Musical Santanense é motivo de orgulho para Santana, sendo exemplo de como a cultura popular pode ser mantida viva através da participação ativa da comunidade. Que o empenho demonstrado até aqui possa servir de inspiração às gerações futuras, garantindo que os Autos Pastoris continuem a ser, por muitos anos, um símbolo de identidade, pertença e celebração coletiva.
(1):
Primeiro Ato: Prólogo; Pastores Brutos
Segundo Ato: Camilo e Cacilda; Cego e o Moço; Passarola; Cinco Pastoras
Terceiro Ato: Pastora Perdida; Cena Nova; Romagem das Cebolas; Sermão
Quarto Ato: Romagem do Diabo

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