Clarinete: uma ferramenta para a vida
- Jorge Monteiro
- 17 de ago.
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"Rufino Patrão, 75 anos, corrobora o entusiasmo de Manuel. Dá graças ao Luxemburgo pela aposentadoria desafogada, por haver conseguido vencer na vida e dar o melhor aos seus.
Nasceu em Santana, outra terra nos arrabaldes de Ribas. “Mestre de carpintaria” só estudou até à quarta classe. Emigrou aos 23 anos, dois anos antes da revolução a 25 de Abril.
Além do dom da transformação de blocos de madeira em mobílias, Rufino toca clarinete. Aliás, acompanhou como corneteiro a cerimónia fúnebre do ditador Salazar desde o Mosteiro dos Jerónimos até Santa Comba Dão, enquanto cumpria o serviço militar em Lisboa.
Após poucos dias, vai a salto para o Luxemburgo. Um colega leva-o de carro até Vilar Formoso, passa a fronteira a pé pela mata para Fontes de Onor. Compra o bilhete de comboio para Irun. A polícia espanhola apanha-o indocumentado em Valladolid, mas deixa-o avançar.
Havia uma barreira de polícias em Irún, entre Espanha e França, a rusgar todos os que pretendessem atravessar a fronteira. “Entrei à força para a parte francesa”, recorda Rufino, que empurrou e escapou aos guardas espanhóis.
Daí seguiu até ao Luxemburgo, rumo a uma vida melhor. A arte do clarinete não serviu somente para embalar o eterno sono de Salazar. “A música foi uma grande ajuda no Luxemburgo, deu-me a conhecer o mundo”, explica.
Rufino abriu um espetáculo de Fernando Tordo, em 1973, aquando da Eurovisão. O dote sonoro permitiu uma integração suave através do associativismo: “Vivi sempre bem, metido em organizações e associações, a apresentar espetáculos e a participar em bandas”, acrescenta.
Além da mestria de sopro, “a arte da carpintaria era muito rentável” no Grão-Ducado, afirma o português. Após seis meses, a mulher foi ao seu encontro e empregou-se como senhora de limpezas. Durante esse tempos, só voltam a Portugal a cada dois anos.
Mas ao fim de 13 anos de trabalho, as poupanças do casal tornam-se vistosas, compram dois apartamentos e constroem uma casa em Portugal. “Devo isso ao Luxemburgo”, diz Rufino ao Contacto. Ganhava 90 escudos por dia em Portugal, o salário triplicou no Grão-Ducado. Viveu em Strassen e na capital, trabalhava em Cessange.
“Graças ao Luxemburgo, o meu filho estudou, é engenheiro químico, e anda em carros novos. Não me posso queixar”, acrescenta. O regresso a Portugal é por que gosta do país e “ninguém esquece as raízes”, mas para “quem quer trabalhar é melhor o Luxemburgo”, conclui Rufino."
Reportagem "Quando os reformados voltaram do Luxemburgo, a aldeia renasceu", publicada pelo jornal Contacto em 03.03.2025, onde destacamos a participação e as declarações do santanense Rufino Patrão.

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