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Figueiredo Cornetim: A Voz Poética de Santana

Diz-se que quem escreve quadras populares fá-lo com a pena do coração. No caso de Manuel Gomes de Figueiredo Júnior — ou, como era carinhosamente conhecido entre os seus, Figueiredo Cornetim — essa máxima ganha corpo e alma. As suas palavras nasceram do chão que pisava, das flores que via desabrochar em maio, das vozes das raparigas que cantavam nas ruas da aldeia, e da memória viva de um povo que nunca quis esquecer quem era.

Homem de origens humildes, que pouco mais sabia do que ler e escrever, Figueiredo Cornetim foi, no entanto, um verdadeiro mestre da alma popular. Possuidor de uma rara intuição musical e uma sensibilidade poética invulgar, tornou-se o cornetim mais famoso de toda a região na sua época, não apenas pelo talento, mas pela dedicação incansável à música, à sua terra e às suas gentes.

Compôs marchas originais para o Rancho do 1º de Maio da Filarmónica Santanense, com letras também de sua autoria, onde exaltava a beleza das mulheres da terra, a alegria das tradições e o orgulho profundo de ser santanense.

As suas quadras, como as que hoje revisitamos com emoção, revelam mais do que engenho poético. São testemunhos vivos de uma visão simples mas profundamente enraizada: a de quem observa o mundo a partir da sua aldeia e o transforma em arte. E fá-lo com verdade, com sentimento, com um amor genuíno pela terra que o viu nascer.

Imaginamos Figueiredo Cornetim sentado num banco à porta de casa enquanto o som de um ensaio do rancho ecoa ao longe. Talvez nessa tarde de primavera, com os ares cheios de flores e os campos vibrando em cor, lhe tenham vindo à mente os versos que celebram a sua terra — "A nossa aldeia é das mais lindas / Que entre outras não tem rival" — não por vaidade, mas por amor.

A sua poesia não é só elogio: é pertença. Escreveu “São todas cravos e rosas” como quem descreve irmãs, vizinhas, filhas da terra. Chamou-as “flores airosas”, não por galanteio, mas porque via nelas a beleza firme das mulheres de Santana — aquelas que dançam com o pote à cabeça, que levam o dia às costas e ainda guardam tempo para cantar.

O Primeiro de Maio, esse dia simbólico, era para ele mais do que uma data no calendário. Era o renascer da esperança, o tempo de reviver tradições e de ver a aldeia inteira em flor. Talvez tenha escrito “Vamos todos, raparigas / Cantar com os nossos amores” como quem convoca a juventude para manter acesa a chama do passado — não como nostalgia, mas como continuidade.

Figueiredo Cornetim foi, acima de tudo, um homem atento. O seu “cornetim” era metafórico: era o instrumento através do qual soava a identidade de Santana. Não precisava de fanfarras — bastavam-lhe quatro versos para tocar o coração de quem ouve.

E assim, nos seus versos simples mas profundos, deixou-nos uma herança maior do que parece: o orgulho de ser de Santana, e a certeza de que, enquanto houver quem cante e quem dance, as palavras do poeta continuarão a viver entre cravos e rosas.


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